Hoje não tem foto, nem receita.
Quem lê o blog deve ter percebido que ultimamente eu não ando muito animada no geral, e menos ainda com a cozinha – na verdade, falta de ânimo, cansaço e tristeza são coisas que muita gente com quem converso tem sentido, especialmente se a pessoa mora no Brasil. Lidar com uma pandemia, ver gente imbecil dizendo que não vai tomar vacina porque “causa autismo” ou porque “tem GPS na vacina” (entre outros absurdos), testemunhar o desmonte quase que completo do nosso país em tão pouco tempo é revoltante, trágico, me causa raiva, um ódio tão profundo que eu nem sabia que poderia sentir.
A gente vai levando, tocando pra frente, às vezes sem saber direito pra onde, tudo fica meio mecânico, levanta da cama, trabalha, come, toma banho, vê TV. E todo dia é assim, e foram vários meses desta forma. E eu sempre pensava que, quando estivesse vacinada, voltaria a sair, pelo menos para algumas coisas, pelo menos para comer aos finais de semana. E de fato atualmente é isso, almoço fora de vez em quando, pizza à noite em uma sexta ou sábado. E, na minha cabeça, isso resolveria a minha falta de vontade de cozinhar, pois o ranço era culpa da pandemia e de cozinhar todo santo dia por mais de um ano.
Só que algo se quebrou pelo caminho e o meu plano não funcionou.
Curiosamente, durante os últimos 14 meses, fui trabalhando em um projeto de um livro, bem aos pouquinhos, quando dava, e o danado está praticamente pronto – ainda tenho que testar novamente algumas receitas para fotografar e reescrever alguns trechos, mas o grosso, como dizem, eu já fiz. E quando eu testava essas receitas, as fotografava e as escrevia, me sentia bem, uma sensação de dever cumprido, de prazer de fazer algo com tanto carinho. E esse “combustível” foi me alimentando por meses, mais de um ano, só que acabou.
Eu achava que era preguiça e/ou cansaço de cozinhar, e continuei fazendo almoço, pão, pizza. Mesmo sem vontade, afinal de contas temos que comer.
Até o dia em que eu fui para a cozinha para preparar o almoço e, ao começar a aquecer o azeite na panela para refogar a cebola, eu quis sumir dali. Durante todo o processo de fazer o arroz, refogar a abobrinha, preparar e temperar a salada, eu queria sair correndo. Os cheiros me enjoavam, meu apetite desapareceu: comi uma colherada de arroz e uma de salada, e me obrigando a comer, só pra não ficar com dor de cabeça de fome depois.
Não era cansaço, não era preguiça, não era falta de vontade: era repulsa.
Cozinhar por obrigação já foi parte da minha vida em vários outros momentos, na adolescência, antes de casar também, e eu fazia a comida mesmo sem querer fazer, mas sentir repulsa foi a primeira vez desde os meus 11 anos (tenho 43).
O processo todo me fez entrar em uma espécie de crise: como assim eu não quero mais cozinhar? Eu cozinho há mais de trinta anos! Eu não POSSO não gostar mais de cozinhar. Quem sou eu sem a cozinha? O que eu faço agora?
Não sei o que vai ser das refeições aqui em casa, não sei o que vai ser do blog - eu não sei. Não sei de nada. De absolutamente NADA.
Tô me sentindo perdida, triste, angustiada. A única coisa que se fato sei é que precisava tirar isso do meu coração – tá sendo difícil lidar.
O blog continuará aqui, eu jamais deletaria nada. Só não sei quando vem o próximo post, SE vem. Mas as receitas já publicadas permanecem aqui, para que vocês possam reproduzi-las em casa se tiverem vontade.
Obrigada pela companhia, por tanto tempo. xx